quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIENCIA

Direitos das pessoas com deficiência.
A convenção ainda não vale como emenda constitucional
Elaborado em 01.2009.
Luiz Flávio Gomes
doutor em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade Complutense de Madri, mestre em Direito Penal pela USP, secretário-geral do Instituto Panamericano de Política Criminal (IPAN), consultor, parecerista, fundador e presidente da Cursos Luiz Flávio Gomes (LFG) - primeira rede de ensino telepresencial do Brasil e da América Latina, líder mundial em cursos preparatórios telepresenciais
Valerio de Oliveira Mazzuoli
Doutor 'summa cum laude' em Direito Internacional pela UFRGS. Mestre em Direito Internacional pela UNESP. Professor Titular de Direito Internacional Público da UFMT.
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A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, embora aprovada por quorum qualificado pelo Congresso Nacional, ainda não vale como Emenda Constitucional.
Fundamentação da nossa tese: o tratado internacional (convenção) sobre os direitos das pessoas com deficiência foi aprovado pelo Congresso Nacional brasileiro com o quorum previsto no art. 5°, § 3°, da Constituição Federal (com a redação dada pela EC 45/2004). A aprovação com o quorum qualificado de três quintos dos votos dos membros de cada Casa do Congresso, em dois turnos, garante a tais tratados o mesmo status das normas constitucionais. Ocorre que o Presidente da República (até o presente momento) ainda não expediu o decreto de ratificação (e vigência) do tratado no ordenamento jurídico interno brasileiro.
A aprovação da Convenção e do seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque em 30 de março de 2007, se deu pelo Decreto legislativo n° 186, publicado no Diário Oficial da União nº 160, de 20 de agosto de 2.008. A aprovação legislativa respeitou a maioria qualificada acima descrita. Em virtude disso o Congresso Nacional brasileiro noticiou (e a imprensa também) que tal tratado já valeria no Brasil como Emenda Constitucional. Isso, entretanto, (ainda) não se concretizou.
O art. 5°, § 3°, diz que os tratados aprovados com o quorum qualificado que estabelece "serão equivalentes às emendas constitucionais": aqui reside a origem da confusão entre os congressistas (e também na doutrina). A leitura rápida do dispositivo leva à falsa impressão de que os tratados assim que aprovados já teriam valor de emenda no Brasil. Na verdade, para que tal ocorra, deve ainda haver a ratificação do Presidente da República, o que ainda não ocorreu em relação ao tratado aqui cuidado (sobre a necessidade dessa ratificação, cf. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira, Curso de direito internacional público, 3ª ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2009, pp. 190-204).
A aprovação parlamentar de um tratado – mesmo pelo rito do § 3° do art. 5° – não lhe garante automaticamente aplicabilidade interna antes dessa ratificação presidencial. Após ela o tratado ganha valor jurídico interno. Depois disso haverá o depósito de seu instrumento constitutivo nas Nações Unidas, nos termos do art. 102 da Carta da ONU. Mas esse depósito não condiciona a vigência do tratado internamente. Para isso, repita-se, basta a ratificação presidencial (por decreto).
Logo que vier a ratificação de que estamos falando teremos, no Brasil, o primeiro tratado de direitos humanos com valor constitucional. A aprovação congressual de um tratado não tem senão o efeito de autorizar o Presidente da República a ratificá-lo (cf. MAZZUOLI, obra citada).
Foi louvável a iniciativa de se aprovar um tratado sobre esse tema – direitos das pessoas portadoras de deficiência – pelo procedimento estabelecido pelo art. 5°, § 3°, da Constituição, o que demonstra o engrandecimento da cidadania no Brasil. De qualquer modo, do ponto de vista formal impõe-se respeitar o devido procedimento legislativo para que o tratado possa ter valor de emenda constitucional.
No histórico julgamento de 03.12.08 (HC 87.585-TO e RE 466.343-SP) o STF firmou o entendimento de que os tratados de direitos humanos aprovados sem o quorum qualificado acima descrito valem como normas supralegais (ou seja: mais que a lei ordinária e menos que a constituição). Venceu (por ora) a tese defendida pelo Min. Gilmar Mendes: cinco votos a quatro. Ficou vencida a tese do Min. Celso de Mello (no sentido da constitucionalidade dos tratados de direitos humanos).
A partir desse histórico e emblemático julgamento impõe-se distinguir o seguinte: tratados de direitos humanos aprovados pelo Congresso Nacional com o quorum qualificado de dois terços (em dois turnos em cada Casa) valem como Emenda Constitucional. Os demais tratados (de direitos humanos), aprovados sem esse quorum, valem como normas supralegais.
Numa ou noutra hipótese, de qualquer modo, é certo que o tratado de direitos humanos (quando entra em vigor no Brasil) derroga todas as normas legais contrárias (ou seja: a antinomia entre a lei, que está no patamar inferior, e os tratados – de nível superior - é resolvida pela derrogação da primeira). Como regra geral é exatamente isso que deve ser observado (e é o que foi proclamado pelo STF). Foi com base nesse entendimento que o STF sublinhou que não cabe mais no Brasil prisão civil de depositário infiel (no HC 87.585-TO e RE 466.343-SP).

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